16 de outubro de 2024
marinadilma

João Marinho*

marinadilmaUma palavra para meus conhecidos dilmistas e marineiros: não é preciso tentarem me convencer a não votar em qualquer das duas senhoras.

Em relação a Marina, basta ver o que aconteceu, com seu recuo. Confesso que fiquei bastante admirado com as propostas iniciais progressistas, mas com o pé atrás, o que acabou se confirmando correto… E faz muitos anos que decidi nunca votar em políticos evangélicos, por saber como a religião atua no campo da moral pessoal e por saber como ocorre a pressão por parte das igrejas.

Em relação a Dilma, tanto pior. Não sei dizer se Dilma é pessoalmente homofóbica – há boatos até de que seja lésbica. No entanto, a verdade é que não me interessa se, na vida particular, entre os amigos, Dilma gosta ou não de gays. Interessa-me seu papel como presidente, e ela esteve à frente do governo mais homofóbico visto no Brasil desde a redemocratização.

Lamento informá-los que também não funcionam justificativas parciais como se fossem verdades integrais. Nesse sentido, tanto dilmistas quanto marineiros se irmanam: as decisões homofóbicas são sempre justificadas com base nas forças políticas de outras pessoas ou em outras instâncias. São os “apoiadores”, o “diálogo que precisa travar com toda a sociedade” e, especialmente no caso de Dilma, o “Congresso, já que a presidente não governa sozinha”.

Por que essas justificativas são parciais? Porque, sim, sabemos que muita coisa depende do Congresso. No entanto, em primeiro lugar, o Executivo tem suas próprias atribuições constitucionais e sua independência, de maneira que nem sempre ele dependerá do Legislativo para executá-las – e pode fazer alguma coisa dentro de sua própria esfera de poder. Segundo, porque não se pode deixar de considerar a força política de mobilização do Executivo junto à base aliada, especialmente quando este tem maioria.

No Brasil, sob o governo de Dilma, temos dois casos bem emblemáticos disso: o veto ao Kit Escola Sem Homofobia; e o enterro do PLC 122.

No primeiro caso, estávamos diante de uma iniciativa própria do Executivo, que não dependia, por exemplo, de aprovação de lei prévia por parte do Legislativo. Dilma vetou o kit – e não por sua qualidade ou pela falta em atingir seus objetivos. Foi para preservar Antonio Palocci, então suspeito de enriquecimento ilícito, e cuja cabeça havia sido ameaçada pela bancada evangélica caso ela não vetasse o kit.

Diante dessa situação, Dilma poderia ter feito uma série de coisas, já que estávamos diante de uma ação que era atribuição do Executivo. Poderia, por exemplo, ter demitido Palocci. Optou por tentar manter a cabeça do ministro – que, no fim, acabou defenestrado -, vetou o kit e fez a opção de escolhê-lo em vez do combate ao bullying que afeta e vitimiza milhares de adolescentes e crianças LGBTs todos os dias. Ainda foi dizer, em cerimônia no Planalto, que não aceitava propaganda de “opções” sexuais (sic) – quando esta jamais foi a proposta do kit. Quando podia fazer algo, não o fez. Quando era uma atribuição do Executivo, não o fez. Deu as costas – não posso votar em alguém que age assim e faz essa opção.

O enterro do PLC 122 vai no extremo oposto. Iniciativa do Legislativo, não era da alçada primordial do Executivo o que aconteceria com ele… Mas foi. De olho nas eleições de 2014, Ideli Salvatti, líder do governo no Senado, foi acionada pelo Planalto para convencer a base aliada a apoiar o apensamento do projeto à discussão do novo Código Penal. Conseguiu – com apoio da bancada tucana, é verdade -, e o PLC morreu. Como, então, justificar que a presidente e seu governo não tenham nenhuma influência ou ingerência sobre o Legislativo? Têm, mas fez-se uma opção política que nos rifou, novamente.

Sim, o Executivo pode mobilizar forças dentro do Legislativo, e ainda que admitamos que nossas pautas não sejam aprovadas do jeito que queríamos por causa da relação de forças no Parlamento, a dura verdade é que Dilma poderia ter feito um governo menos homofóbico, uma vez que tinha uma larga e confortável maioria nas casas legislativas, maior do que a de Lula, mesmo se toda a bancada religiosa evangélica a abandonasse. Novamente, houve uma opção política – e esta opção não é integralmente “forçada” pelo Parlamento.

Dito isso, eu devo confessar que até consigo entender LGBTs que votem em Dilma e Marina. Não LGBTs como eu, para quem a pauta LGBT é primordial – e só depois passamos a discutir as outras… Mas há quem vote em uma e em outra por uma série de outras razões que extravasam essa pauta.

Entre os dilmistas, tenho um amigo que será eleitor do PT e me confessou que sabe que Dilma fez um governo retrógrado na questão LGBT. Como, porém, nem Aécio e nem Marina o convencem de que farão um governo menos retrógrado nesse tópico – todos estão no mesmo nível homofóbico -, o que decidiria seu voto seria o bolso… E ele acredita que a proposta de Dilma na economia é melhor. É um argumento que me soa justo.

Consigo também entender os LGBTs marineiros que optam por Marina em busca do mal menor. Para esses, o governo de Dilma foi tão ruim, marcado pela corrupção e por questões econômicas complicadas que vale a pena tentar uma mudança. E por que Marina essa mudança… E a pauta LGBT? Reconhecem que Marina é conservadora e que a pauta LGBT não avançará muito com ela, mas apostam que, por seu histórico, ou fica do jeito que está ou, ao menos, não sofrerá um recuo como sofreria em um novo governo Dilma, além de que as propostas de Marina são insuficientes, mas, pelo menos, há alguma. Novamente, é um argumento que me soa justo.

O que não me soa justo é um LGBT tentar me convencer que Dilma é super pró-gay, que fez um governo “progressista” e que, no segundo mandato, nos tratará melhor que o primeiro. Nem me convencer de que ela não é homofóbica, enquanto presidente, e tentar maquiar o recuo que tivemos em 4 anos. O que não me soa justo é um LGBT tentar me convencer que a evangélica Marina não é conservadora e que as críticas que se levantam contra ela são oriundas de um “preconceito contra evangélicos” e que o recuo vergonhoso em seu programa de governo para os LGBTs não foi um recuo vergonhoso… Foi um “erro de diagramação” – e que as propostas são “as melhores”.

Querem votar em Dilma e Marina, ok… Mas ao menos tenham a hombridade de reconhecer uma verdade inconveniente: NENHUMA das duas candidaturas nos representa, nenhuma é efetivamente progressista para os LGBTs e nenhuma pode ser deixada de se reputar homofóbica. Marina, pelos valores morais. Dilma, pelo histórico vergonhoso. E que, nessa hombridade, possam ser sinceros como os dois amigos que citei mais atrás: reconhecemos tudo e estamos em busca de um mal menor, ou ao menos evitar uma piora.

Não soa muito mais realista?

* João Marinho é ativista, jornalista diplomado pela PUC-SP e hoje atua como editor-chefe em veículos de conteúdo adulto, revisor e designer free-lancer.

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