20 de abril de 2024
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A medalha foi uma iniciativa do deputado estadual Flávio Serafini (PSol). Foto: Octacílio Barbosa / Alerj

A medalha foi uma iniciativa do deputado estadual Flávio Serafini (PSol). Foto: Octacílio Barbosa / Alerj.

Ativista LGBT do complexo de favelas da Maré, Gilmara Cunha é reconhecida por levar adiante a luta pelos direitos da população LGBT nas comunidades do Rio

Publicado por Felipe Martins, no Blog LGBT do portal O Dia

Pela primeira vez na história do estado do Rio de Janeiro, a Medalha Tiradentes, maior comenda do Estado do Rio, foi entregue a uma pessoa trans. A homenagem à ativista Gilmara Cunha aconteceu na noite desta terça-feira, no salão nobre da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Criadora da ONG Conexão G, ela atua ao lado de jovens da localidade na difusão dos direitos de gays, lésbicas, travestis e transexuais no Complexo da Maré, conjunto de favelas às margens da Avenida Brasil, e leva seu conhecimento a outras comunidades do Rio que começam a formar núcleos de apoio à população LGBT.

Gilmara desempenha papel fundamental no movimento LGBT do Rio de Janeiro ao conseguir protagonismo e levar ao poder público uma agenda política voltada aos moradores de favela. Seu poder de aglutinar pessoas é demonstrado ano a ano com a realização da Parada LGBT da Maré, mesmo sem um centavo de recursos do estado e do município. Gilmara ainda apoiou a criação das paradas do Complexo do Alemão, na Zona Norte, e de Rio das Pedras, na Zona Oeste.

Quando começou o Conexão G, há quase 10 anos, Gilmara enfrentou o preconceito a resistência e a desconfiança de parte dos moradores da Maré, que ainda enxergavam o LGBT como um cidadão de segunda classe. Num trabalho de formiguinha, ela vem derrubando preconceitos e levantando a autoestima da população LGBT da região, o dia da Parada acabou virando um dos mais aguardados no calendário da favela, um evento de integração e inclusão. “As pessoas achavam que os LGBTs se limitavam a promiscuidade, que não querem nada além de sexo. Com um bom tempo de trabalho, a comunidade começou a aderir a proposta e ver que o Conexão G era e é um trabalho sério que, mesmo com a falta de recursos, mesmo que o estado não se faça presente, luta para que o preconceito seja minimizado, luta para que essa parte da população que vive à margem da margem da sociedade seja respeitada”, comentou Gilmara.

Na Maré, O Conexão G realiza palestras sobre cidadania, promove ações de conscientização e prevenção a doenças sexualmente transmissíveis e realiza ações de cultura, como a exibição de documentários que discutem o tema da homofobia. Gilmara diz ocupar um espaço deixado vazio pelo estado. “A gente ainda precisa gritar: deixe-me existir. Hoje a gente vive a militarização das favelas, não existe um olhar humanitário”, argumentou. Para ela, é urgente a entrada de ações sociais consistentes e duradouras nas comunidades pobres. “Não basta segurança pública, precisa de dignidade. Precisa de saúde, de escola, de assistência social. A favela é vista como um local de guerra. Infelizmente, os nossos gestores ainda cagam e andam, com o perdão do termo”.

De acordo com dados da Prefeitura, a Maré é a quinta região mais pobre do Rio de Janeiro, melhor apenas de que Acari, Parque Colúmbia, Costa Barros e Complexo do Alemão. Contudo, conta com uma intensa rede de organizações que lutam pelos direitos dos moradores e na valorização da cultura local. A distância do poder público se faz sentir, segundo Gilmara, na ausência de programas pensados para os moradores de áreas pobres. Ela cita o Centro de Referência LGBT como um exemplo desse abismo entre estado e favela. “O morador da Maré não vai ao Centro de Cidadania da Capital, na Central do Brasil, no prédio onde funciona a Secretaria de Segurança, onde você precisa estar com uma roupa adequada na visão deles, senão você não entra”, comentou. ”

Além da ausência do estado, o trabalho de promoção de cidadania de Gilmara conta com outro adversário ferrenho, as igrejas evangélicas. “O crescimento das igrejas é mais uma doença provocada pela ausência do poder público. Os pastores ganham os moradores com uma prática assistencialista e semeiam pensamentos homofóbicos e transfóbicos. Quebrar esse ciclo só é possível com a presença mais forte do estado, mas isso não vem acontecendo e a consequência é o aumento da homofobia nos territórios de favela”.

Com todos os obstáculos, Gilmara vem conseguindo construir pontes, parcerias que tem ampliado o trabalho da ONG. Ela começa a organizar, com o apoio da Prefeitura, um festival de cultura LGBT das favelas. Ontem, na Alerj, comemorou a medalha não apenas como uma vitória pessoal, mas de toda a população marginalizada do Rio de Janeiro. “Nós moradores de favela, precisamos gritar diariamente para poder sobreviver nessa sociedade que extermina cada vez mais jovens, negros, LGBTs. O principal direito que nos é negado é o da vida. Reconheço a importância de ser a primeira mulher transexual a ganhar a Medalha Tiradentes, mas a minha vitória é acima de tudo um marco de história para a população LGBT de favela. Hoje, aqui, ocupamos uma casa que é do povo, é nossa. É uma alegria que não tem como mensurar representar essas pessoas”, concluiu.

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