“O projeto desqualifica a comunidade LGBT de forma excludente, patriarcal e preconceituosa”, diz da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
Por Sarah Fernandes
Publicado pela Rede Brasil Atual, em 25 de setembro de 2015
São Paulo – Entidades que defendem os direitos da comunidade LGBT consideraram como “discriminatória” e “fundamentalista” a definição de família apenas como a união entre um homem e uma mulher, prevista no Estatuto da Família, cujo texto base foi aprovado ontem (24) por uma comissão especial da Câmara do Deputados. O projeto segue agora para plenário, e se aprovado irá para o Senado e para sanção presidencial.
“Este texto é um ataque à cidadania de todos, por privilegiar um tipo de família em detrimento dos outros. Ele exclui, por exemplo, as famílias homoafetivas, os filhos de mães solteiras e as crianças que são criadas pelos avós. Um quarto da população está excluída desse projeto homofóbico e hipócrita, de quem não quer ver a realidade”, diz o secretário da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Toni Reis. “O projeto desqualifica a comunidade LGBT de forma excludente, patriarcal e preconceituosa. Sou casado com outro homem há 26 anos e pai de três filhos. Me sinto extremamente discriminado e sei que as crianças vão se sentir também.”
O Brasil possuí hoje diferentes arranjos de família, segundo o Censo Demográfico de 2010 (IBGE): a maioria delas (66,2%) é chamada de “nucleares”, formadas por um casal com ou sem filhos ou por uma mulher ou um homem com filhos. Outras 19% são “estendidas” e incluem no modelo anterior a convivência com parentes; 2,5% são “compostas”, contando com a presença de quem não é parente, e os demais 12,3% são pessoas que moram sozinhas.
“Foi um parecer terrível. A gente guarda muita preocupação com a rapidez com que essa discussão está sendo levada. É um projeto claramente discriminatório, que estabelece um retrocesso nos direitos fundamentais e exclui outras formas de família, sob uma argumentação pouco clara”, defende a advogada do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis), Janaína Penalva. “O subterfúgio argumentativo que só há um tipo de família é mentira e não tem argumentação nem valor constitucional. É uma lei para discriminar.”
O texto-base do Estatuto da Família foi aprovado em uma votação conturbada por 17 votos favoráveis e cinco contrários. Quatro destaques ao texto ainda precisam ser votados na próxima reunião. Os deputados chegaram a iniciar a discussão sobre eles, mas as votações no plenário, presididas por Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foram iniciadas, interrompendo o debate.
Após a conclusão da votação, o projeto deveria seguir para o Senado, sem necessidade de ser votado pelo plenário da Câmara. Entretanto, pela regra, deputados podem apresentar recurso para pedir que o texto passe pelo plenário. A deputada Erika Kokay (PT-DF), contrária ao projeto, já adiantou que fará isso.
O parecer do relator do projeto de lei que cria o Estatuto da Família, deputado federal Diego Garcia (PHS-PR), define a família como a união entre homem e mulher por meio de casamento ou união estável, ou a comunidade formada pelo pai ou pela mãe com os filhos. O projeto dispõe sobre políticas de atendimento à família em áreas como saúde, segurança e educação. O projeto, que proposta tramita na Casa desde 2013, é de autoria do deputado Anderson Ferreira. Em 2006, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou, por unanimidade, que os casais homoafetivos têm igual direito ao casamento civil ou ao reconhecimento da união estável.
“A Constituição garante que todos são iguais perante a lei. O projeto tem o respaldo da bancada evangélica, que se vale de valores bíblicos, muito antigos. Os casais gays existem há muito tempo e precisam ter seus direitos garantidos por lei”, defendeu o coordenador do Grupo Gay da Bahia, Denis Gomes.
As entidades já começaram a se mobilizar para impedir a aprovação do projeto. Estão previstos atos de repúdio ao texto, a publicação de uma carta aberta contrária ao Estatuto da Família, a realização de debates em universidades e campanhas para que as pessoas contatem seus deputados, para pedir que votem contra o projeto.
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