10 de dezembro de 2024
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Roldão Arruda

Publicado no Estadão, em 30 de março de 2014

comissaodaverdade1Durante a audiência pública sobre Ditadura e Homossexualidade no Brasil, realizada no sábado (29), em São Paulo, o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, que representava a Comissão Nacional da Verdade, defendeu a criminalização de crimes homofóbicos.

“Vinte e cinco anos depois da Constituição de 1988, não existe uma legislação que puna o delito de discriminação por homofobia”, disse Pinheiro, após ouvir relatos sobre recentes crimes contra homossexuais cometidos no País. “É mais do que tempo que o projeto de lei que criminaliza a homofobia seja aprovado.”

Embora não falasse em nome da Comissão, o cientista político deixou claro que o assunto será discutido pelo grupo e pode fazer parte do capítulo final do relatório que será entregue em dezembro à presidente Dilma Rousseff.

Pinheiro atua na coordenação de um grupo da Comissão Nacional que pesquisa as perseguições a homossexuais na ditadura. Desde a criação da comissão, em 2012, que se cogita na possibilidade de dedicar uma parte do seu relatório final, que será concluído em dezembro, ao assunto. Até ontem, porém, não havia sido realizado nenhum ato público específico para a questão homossexual.

A audiência, no Memorial da Resistência, foi organizada pela Comissão Nacional e pela Comissão da Verdade de São Paulo Rubens Paiva, com o apoio das secretarias estaduais de Justiça e de Cultura. O objetivo específico era tratar de perseguições sofridas por homossexuais nos 21 anos da ditadura, assim como as formas de resistência que essa minoria desenvolveu no período.

O historiador americano e brasilianista James Green, que é professor na Universidade de Brown e assessora a Comissão Nacional, qualificou a audiência como um fato “histórico”.

Green também defendeu a revisão da Lei da Anistia de 1979. “Vou lutar,  aqui no Brasil e fora, até que os agentes do Estado que participaram dessas barbaridades sejam condenados”, afirmou, numa referência a militares e policiais civis que, após terem torturado e assassinado opositores do regime, acabaram beneficiados pela Lei e hoje não podem ser legalmente penalizados.

Green integrou o Grupo Somos, criado em plena ditadura, com o propósito de defender os direitos dos homossexuais e é autor do livro Além do Carnaval, sobre a questão da homossexualidade no Brasil no século 20. Prepara atualmente uma biografia de Herbert Daniel, que fez parte de um grupo de luta armada no período ditatorial e tornou-se um dos primeiros ativistas no País dos direitos dos portadores do vírus da Aids.

Na audiência pública de ontem, Green lembrou que a Lei da Anistia beneficiou torturadores, ao mesmo que excluía militantes de esquerda. “Herbert Daniel não foi incluído na Lei da Anistia porque estava envolvido em dois sequestros de embaixadores, para libertar 110 companheiros e companheiras que foram presos e brutalmente torturados. Ele não foi anistiado, mas as pessoas que torturam os seus amigos foram”, afirmou.

A audiência pública foi encerrada com um painel sobre violações dos direitos dos homossexuais na ditadura. Os seis convidados para fazer exposições terão artigos publicados no livro Ditadura e Homossexualidade no Brasil: Repressão, Resistência e Busca da Verdade, que também é organizado por Green e deve ser lançado em novembro.

Um dos expositores, o advogado Renan Quinalha, assessor da Comissão Estadual, observou que o objetivo dos pesquisadores e ativistas gays não é apenas o acerto de contas com o passado. “O que estamos discutindo aqui também visa influir no relatório final da Comissão Nacional em relação à diversidade”, afirmou. “O objetivo é radicalizar e aprofundar a democracia, levá-la além dos limites que estão postos atualmente.”

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