16 de outubro de 2024
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Neste Dia Internacional Contra a Homofobia (17 de maio), o Catraca Livre evidencia a realidade da população LGBT no Brasil

por Heloisa Aun
Publicado pelo portal Catraca Livre, em 17 de maio 2017

No dia 14 de novembro de 2010, três rapazes foram vítimas de um ataque homofóbico com lâmpadas fluorescentes na avenida Paulista, em São Paulo (SP). Os agressores? Cinco jovens de classe média da cidade, que na época foram detidos pela polícia.

Em 2016, Luana Barbosa dos Reis morreu depois de ser brutalmente agredida por ao menos seis policiais na rua onde morava, em Ribeirão Preto (SP). A mulher de 34 anos era mãe, negra, pobre e lésbica. No mesmo ano, o adolescente Itaberlly Lozano foi assassinado pela própria mãe, Tatiana Lozano Pereira.

Em março de 2017, o caso da travesti Dandara dos Santos, covardemente torturada e morta em Fortaleza (CE), causou revolta após a publicação de um vídeo da violência nas redes sociais. Mais recentemente, o vendedor trans Thadeu Nascimento, de 24 anos, foi encontrado morto no bairro de São Cristovão, em Salvador (BA).

Vídeo mostra travesti Dandara sendo brutalmente agredida até a morte em Fortaleza (Créditos: Reprodução / Facebook)

Apenas no primeiro quadrimestre deste ano, 117 pessoas foram assassinadas no Brasil devido à discriminação por gênero e orientação sexual, conforme levantou o Grupo Gay da Bahia (GGB). O número subiu 18% em relação ao mesmo período de 2016.

De acordo com o relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais (ILGA), o país ocupa o primeiro lugar na quantidade de homicídios de LGBTs nas Américas, com 340 mortes por motivação homofóbica no ano passado.

Já segundo o último levantamento do Grupo Gay da Bahia, 2016 foi o ano com o maior número de assassinatos da população LGBT desde quando a pesquisa passou a ser feita pelo movimento, há 37 anos. De 130 homicídios em 2000, saltou para 260 em 2010 e para 343 em 2016.

“Tais números alarmantes são apenas a ponta de um iceberg de violência e sangue, pois, não havendo estatísticas governamentais sobre crimes de ódio, esses dados são sempre subnotificados já que nosso banco se baseia em notícias publicadas na mídia, internet e informações pessoais”, diz o antropólogo e fundador do GGB, Luiz Mott, responsável pelo site “Quem a homofobia matou hoje”.

Como Mott explica, até hoje não existe um trabalho do governo em documentar as informações oficiais de violência motivada por LGBTfobia. “O governo federal, o estadual e o municipal, através de suas Secretarias de Segurança Pública e outros órgãos, deveria coletar esses dados e fazer as suas estatísticas de crimes de ódio”, afirma.

Devido à falta de estudos no país, o movimento passou a analisar a quantidade de mortes dessa população. “Decidimos iniciar o trabalho há quase quatro décadas, pois esta é a forma mais grave de homofobia, que vai do insulto, da agressão, da discriminação, até a morte. No início, só havia jornais e revistas, e, a partir disso, recebíamos recortes das notícias enviados por grupos gays em todo o Brasil.”

Nos últimos anos, com a internet e as redes sociais, o trabalho realizado pelo grupo foi facilitado. Hoje, os ativistas fazem o levantamento por meio de todas as notícias que aparecem na mídia – tanto em jornais e revistas, como na internet – com as palavras “gay”, “travestis”, “transexuais”, “lésbica”, entre outras. Em seguida, eles realizam a sistematização da informação para ver se de fato a vítima do caso era LGBT.

Os casos narrados acima representam alguns exemplos da triste e cruel realidade da violência homofóbica no Brasil, país em que a cada 25 horas uma pessoa LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, trans e travestis) morre e que mais mata travestis e trans em todo o mundo.

O estudo

O mais recente levantamento do Grupo Gay da Bahia documentou dados em 168 municípios brasileiros no ano passado. Dos 343 assassinatos ocorridos em 2016, 173 eram gays, 144 trans, 10 lésbicas, 4 bissexuais e 12 heterossexuais (parentes ou conhecidos de LGBTs que foram mortos por algum envolvimento com eles).

De acordo com a pesquisa, travestis geralmente são assassinadas a tiro ou espancadas na rua, enquanto gays são mortos dentro de casa, com objetos domésticos: facas, fios elétricos, sufocados na cama, muitas vezes encontrados pelos vizinhos somente pelo odor do corpo já em putrefação.

O estudo diz, ainda, que 31% dos assassinatos ocorridos no ano passado foram praticados com arma de fogo, 27% com armas brancas, incluindo ainda enforcamento, pauladas, apedrejamento, além de casos com requintes de crueldade, nos quais houve tortura e queima do corpo da vítima.

Em relação à idade das vítimas, predominaram as mortes de LGBTs entre 19 e 30 anos (32%). Os menores de 18 anos representam 20,6% dos assassinatos. O relatório aponta que os crimes são cometidos, em sua maioria, à noite ou na madrugada, em lugares ermos ou dentro de casa, o que dificulta a identificação dos culpados.

A entidade também mostrou que apenas em 17% dos homicídios registrados em 2016 os autores dos crimes foram identificados (60 de 343), e menos de 10% das ocorrências resultaram em abertura de processo e punição dos assassinos.

Leia o relatório na íntegra neste link.

Qualquer que seja a forma de discriminação é importante que a vítima denuncie o ocorrido. A orientação sexual ou identidade de gênero não devem, em hipótese alguma, ser motivo para o tratamento degradante de um ser humano. Veja como denunciar aqui.

Ato contra a LGBTfobia e criminalização da homofobia no Rio (Créditos: Tânia Rêgo / Agência Brasil)

Luta e resistência LGBT

O levantamento do número de mortes contra a população LGBT fez com que o Grupo Gay da Bahia se tornasse referência em todo o Brasil nos últimos anos. A mais antiga associação de defesa dos direitos humanos dos homossexuais no país também oferece espaço para outras entidades da sociedade civil que trabalham em áreas similares, especialmente no combate à homofobia e prevenção do HIV e Aids.

Outro grupo de grande importância é o Mães Pela Diversidade, formado por mães de lésbicas, gays, bissexuais, trans e travestis. “Nós colocamos a cara no sol para desconstruir o estigma de que nenhum pai ou mãe tem orgulho de ter um filho LGBT. Nós temos orgulho de nossos filhos, sim!”, afirma Majú Giorgi, ativista e fundadora do coletivo.

“Vivemos em um ciclo vicioso em que adolescentes LGBTs são expulsos de casa e sofrem violências diárias por parte da sociedade. Essa é a realidade que queremos mudar, porque quando eles são acolhidos e protegidos pela família, ficam mais fortes para enfrentar essas situações”, ressalta Giorgi.

Para Luiz Mott, do Grupo Gay da Bahia, é possível pensar em formas de erradicar esses crimes. Primeiro, promover a educação sexual obrigatória em todos os níveis escolares, ensinando crianças e adolescentes a respeitar a diversidade e a não praticar bullying.

Em segundo lugar, criar leis que punam severamente a homofobia, equiparando esses casos ao racismo. “É inaceitável que insultar um negro represente cadeia, crime inafiançável, mas se insultar um homossexual não aconteça nada”, acrescenta o ativista.

A terceira medida é promover campanhas e políticas públicas que garantam saúde integral e segurança a gays, lésbicas, bissexuais, trans e travestis em seus lugares de convívio. “Em quarto lugar, faço um apelo para a própria comunidade LGBT, para que grite e denuncie ameaças e agressões, pois o grito é a arma do oprimido. Não vamos deixar impune nenhum tipo de violência”, finaliza Mott.

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