18 de abril de 2024
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(Imagem: www.unfpa.org.br)

Nota pública do Conselho LGBT do Estado da Bahia sobre a aprovação dos planos municipais de educação

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Na Bahia, foram acirrados os debates envolvendo o conceito “ideologia de gênero e/ou doutrina de gênero” no cerne das disputas para aprovação dos Planos Municipais de Educação nas Câmaras de Vereadores.

De um lado, uma frente de educadoras (es) que compreendem a inserção de questões de gênero, raça, étnica, sexualidade e diversidade nos currículos da educação básica e superior como resultado do consenso produzido pela sociedade nas conferências Nacionais de Educação, de Políticas para as Mulheres, de Igualdade Racial, e LGBT, dentre outras. Cabe destacar que nas Conferências de Educação e nos espaços de discussões para produção dos Planos Municipais e Estaduais de Educação, a compreensão sobre a importância da inserção de temas sobre diversidade no currículo na educação básica é fruto de reflexões profundas e legítimas sobre as condições sociais e culturais que precisam ser transformadas a fim de garantir respeito, direitos e cidadania, fazendo-se necessário que estas dimensões da vida humana sejam conhecidas e discutidas na escola, como caminho par uma vida sem violência para todas as pessoas. Tal aspecto precisa ser considerado e respeitado pelo poder legislativo nos municípios e estados e garantido nos planos educacionais.

Do outro lado, uma frente conservadora constituída pelas igrejas católicas e evangélicas distorcem os conceitos de gênero, diversidade e orientação sexual em sua relação com a educação, comprometendo o avanço na construção do respeito, da pluralidade, da não violência, da dignidade humana. Os argumentos construídos por essa frente buscou suprimir a presença de termos ligados à identidade de gênero, orientação sexual, diversidade e até mesmo temas transversais nos Planos Municipais de Educação. É importante destacar que essa frente ao negar o direito a livre discussão sobre tais temáticas reificam o cenário de desconhecimento, preconceito, discriminação, desigualdades e violência que tem marcado o cotidiano social e o cotidiano escolar de distintas pessoas.

Muito diferente do que se tem propagado, gênero é um conceito que está ligado à reflexão sobre as construções sociais, culturais, e históricas, configuradas em um sistema de práticas que cria e mantém diferenças entre masculino e feminino e produz desigualdades e hierarquias. É utilizado para problematizar as relações desiguais e hierarquizadas com base nas diferenças entre os corpos. Exemplos, dessas desigualdades se materializam em nossa realidade a cada dia. E podem ser vistas diariamente em qualquer canal quando ligamos a televisão.

O Mapa da Violência 2013: homicídios e juventude no Brasil (WAISELFISZ, 2013) aponta que de 1980 a 2011, 96.612 mulheres foram assassinadas no país. De 2001 a 2011, o índice de homicídio de mulheres aumentou 17,2%, com a morte de mais de 48 mil brasileiras nesse período. Em 2011, mais de 4,5 mil mulheres foram assassinadas no país. Desse total, a taxa de mortes dentre as mulheres jovens foi de 7,1 por grupo de 100 mil, enquanto na população não jovem, com idades abaixo de 15 e acima de 24 anos, o índice foi de 4,1. Em relação ao homicídio feminino na população jovem no referido mapa da violência 2013, a Bahia ocupa o 6º lugar, com índice de 10,2 homicídios. O ordenamento das capitais segundo taxas de homicídio feminino (por 100 mil habitantes) situa Salvador em 5º lugar, com índice 9,2 em relação à população total e em 4º lugar, com índice 18,8 em relação à população jovem. Quando observado a cor dos homicídios de mulheres no Brasil, embora não apresente dados em relação ao homicídio de mulheres negras, o Mapa da Violência 2013 aponta que o número de vítimas brancas caiu de 18.867 em 2002 para 13.895 em 2011, dado que representa um significativo decréscimo de 26,4%. Em relação às vítimas negras, houve um aumento de 30,6% no mesmo período, de 26.952 para 35,297. Assim, a participação branca no total de homicídios do país cai de 41% em 2002 para 28,2% em 2011. Já a participação negra, que já era elevada em 2002, 58,6%, teve um significativo aumento, vai para 71.4%. Com esse diferencial a vitimização negra passa de 42,9% em 2002 para 153,4% em 2011, em crescimento contínuo, ano a ano, dessa vitimização.

Em relação à violência de gênero contra pessoas LGBT, a situação de vulnerabilidade desse segmento é agravada pela falta de legislação específica para prevenir, punir e erradicar a violência contra LGBT. Em 2013, o relatório do GGB registra que houve um pequeno decréscimo no número de assassinato de pessoas LGBT. No total foram 312 assassinatos, decréscimo de 7.7% em relação a 2012. Embora o Brasil não seja citado no Relatório Homofobia da ILGA (2012) entre os piores lugares do mundo para as pessoas LGBT, a lgbtfobia e a impunidade que tomba corpos e ceifa vidas LGBT no país desafiam todas as pessoas comprometidas com a defesa dos direitos humanos a refletir sobre estratégias locais, regionais e nacionais de enfrentamento e superação da homofobia. Da mesma forma, a violência de gênero contra as mulheres e o racismo, que embora sejam violações dos direitos humanos enraiadas no ordenamento jurídico do país, são naturalizadas a cada dia e se espalham pelos fios da cultura, desafiando toda a sociedade a refletir novas estratégias de enfrentamento e superação da violência de gênero e do racismo como condição necessária à qualidade de vida em âmbito local, regional e nacional.

De acordo com a pesquisa nacional do DataSenado, realizada em 2008, por telefone com 1.120 pessoas de 119 municípios, incluindo capitais, 77% da população brasileira com idade entre 30 e 39 anos defende a criminalização da lgbtfobia. Porém, apesar da aceitação popular, a aprovação do PL 122, de 2006 – que torna crimes à discriminação e o preconceito contra LGBT, encontrou uma série de obstáculos colocados pela bancada fundamentalista, que não mede esforços para patologizar a homossexualidade. Enquanto o Brasil não avança no debate para prevenir, criminalizar, punir e erradicar a violência de gênero contra LGBT, a prática de violência contra esse segmento da sociedade avança silenciada pelas ruas, praças, casas, religiões, profissões, instituições, frente à ausência de direitos. Uma ausência, que compromete a garantia do desenvolvimento humano da população mundial.

O reconhecimento do papel da escola e da educação no enfrentamento as desigualdades em torno das questões de gênero e diversidade sexual, bem como o reconhecimento da homofobia é recente nas políticas públicas de educação no Brasil, e em face dos aspectos citados ao longo desse manifesto, esse reconhecimento não pode ser suprimido. Não se pode negar que as instituições educativas colaborem com a construção e desconstrução de saberes e práticas em torno dessas questões em função de argumentos que não correspondem à realidade e que desconsideram diversas vozes de modo antidemocrático.

Diante do exposto, reivindicarmos a inserção dessas temáticas nos planos educacionais e nas práticas educativas escolares. Entendemos que a promoção de uma cultura de valorização e reconhecimento das questões em torno do gênero, das sexualidades, da diversidade sexual, tem o potencial de promover novas formas de aprender, reconhecer, ser, agir, pensar e sentir, sem desconsiderar as diferenças, contudo não fazendo destas pontes para as desigualdades e discriminações. Assim, conclamamos toda a sociedade baiana a somar esforços na tessitura de uma educação que reconheça e respeite as diferenças.

Salvador, 10 de julho de 2015.

Conselheiras e Conselheiros dos Direitos da População de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais

Conselho Estadual LGBT (Bahia)

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