29 de março de 2024
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Gilmaro Nogueira
Publicado no site Cultura e Sexualidade, em 23 de fevereiro de 2016

Você pode ter lido esse título e achar que é uma imprecisão, mas não o é. Pessoas não são vulneráveis, elas são vulnerabilizadas por instituições que falham em reconhecer a cidadania de todxs xs sujeitxs. Quando o Estado não propicia políticas públicas que assegurem o bem-estar das pessoas, ele se compromete eticamente com sua função e objetivo, inclusive porque participa, juntamente com a sociedade em geral, de uma posição política que hierarquiza sujeitos e os trata de modo desigual. Não há uma posição neutra e toda ação que não é realizada coopera com as violências que são cometidas com cidadãos. Não agir é agir em favor da desumanização de pessoas.

Diante dessas questões é preciso denunciar a falta de assistência e de promoção da cidadania do Governo Estadual da Bahia e da Prefeitura de Salvador à população LGBT. Chega a ser vergonhoso o que aqui não se faz, mas se diz fazer em respeito à dignidade de sujeitos que sofrem violências por questões referentes às sexualidades e gêneros.

Não costumo falar de violências aqui, mas diante de tantos casos que me chegam não tenho como ignorar essa questão. Como pesquisador e envolvido em questões políticas (não gosto do termo militante), afirmo que não tinha noção da dimensão das violências que ocorrem todos os dias. É costumeiro falarmos de como a sociedade tem sido mais “tolerante” à diversidade sexual, mas o que nos chega no serviço de psicologia que implantamos é muito maior do que imaginamos.

Toda semana temos sido solicitados a dar assistência para pessoas que tem sido violentadas psicologicamente, fisicamente e simbolicamente. Esse mês (de fevereiro) já fizemos o suporte a três pessoas que estavam em risco de suicídio. Muitos desses sujeitos chegaram até nós através do Grupo Mães da Diversidade que tem sido constantemente procurado para esse fim.

Ainda que de forma preliminar, pois ainda temos pouco tempo de coleta de dados, temos percebido que grande parte das demandas são de violências físicas praticadas por pais e mães em suas filhas lésbicas. Não sei se as lésbicas têm sido julgadas mais vulneráveis pelos familiares e passíveis de violências físicas. Esses casos de violências envolvem conflitos de crenças religiosas e a sexualidade dessas jovens. Outra questão que merece ser mencionada é que muitos adultos que violentam essas jovens podem até lidar bem a diversidade sexual de outras pessoas, inclusive alguns têm amigos e amigas gays e lésbicas, mas não aceitam quando são seus filhos e filhas.

Vale ressaltar que as pessoas trans que sofrem violência nem sempre chegam até nós e um dos motivos é que grande parte dessas violências são contra a vida, o direito à humanidade, o que faz com que os casos sejam noticiados a partir da morte.

E o que isso tem a ver com o Estado/Prefeitura? Pois bem, essas instâncias de Governo nada têm feito para melhorar a situação. Em 2014, tinha no Estado um Centro de Promoção e Defesa dos Direitos  LGBT* que permaneceu ativo por um ano, mas foi fechado após as eleições. Esse serviço era essencial para construir uma rede de assistência. O Estado quer implantar outro centro no ano das eleições.

Agora, a Prefeitura de Salvador implantou ou vai implantar um Centro LGBT que já está com imóvel pronto e alugado há um ano, com um aluguel mensal de R$ 9.000,00, mas que permanece fechado. Após uma batalha política de 8 grupos que queriam coordenar o centro, e depois da escolha de um, que pode angariar mais votos, eis que o mesmo se mantem inoperante, – acredito que espera as eleições para então “colocar a cara no sol”. O que me permite concluir que o que se faz aqui é de interesse meramente político e ninguém se importa com 90 mil gastos.

Comparemos o orçamento do Governo do Rio de Janeiro e do Governo da Bahia para políticas públicas LGBTs e veremos que o que aqui (não) se faz é uma vergonha. A pasta LGBT do Governo do Estado não tem um centavo. Foi feita muita propaganda com a contratação de uma transexual para coordenação das questões LGBTs no Estado, mas para fazer o que, sem recursos? Mesmo com todo o trabalho e esforço, a mesma foi retirada do cargo e colocada em outro, enquanto as trans que precisam dessa representatividade continuam sendo violentadas.

Quero contar outra situação. Um mês atrás, um rapaz foi violentamente agredido, mas felizmente conseguiu manter sua vida. Após dar queixa e dizer que sofreu homofobia, várias falas alardearam que não era um caso de homofobia, contradizendo a fala da vítima, inclusive por representantes de ONGs LGBTs que deslegitimaram a fala de um rapaz que sofreu cortes no corpo, teve inscrições em sua testa e pancadas na cabeça. O mesmo sofreu violência institucional na polícia, que somente mudou após sua empregadora se envolver e utilizar de seus conhecimentos políticos para que o mesmo não fosse mais violentado, culpabilizado e sofresse mais ainda com o descaso.

Se alguém sofrer violência LGBTfóbica neste Estado, precisa ser preparar para enfrentar outras violências nas instituições que deveriam prestar segurança e assistência. Que não se conte com o Governo em suas instâncias, ao menos até o período de eleições.

Aproveito e agradeço ao grupo que trabalha comigo e que tem se dedicado ao atendimento psicológico desses sujeitos, com tanta dedicação. Vamos adiante, fazendo o que podemos, mas sem jamais deixar de cobrar a quem tem obrigação de fazer mais.

Nosso serviço de suporte psicológico é gratuito e pode ser solicitado por todas pessoas LGBTs. Funciona na Faculdade Ruy Barbosa, Rio Vermelho – Salvador. Quem quiser solicitar atendimento pode preencher o seguinte formulário.

Solicitar atendimento

Quero ainda ressaltar a importância do Grupo Mães da Diversidade que tem encaminhado a maior parte das pessoas e da Defensoria Pública do Estado da Bahia que tem feito um bom trabalho de assistência jurídica e psicossocial.

* Errata: O Centro de Promoção e Defesa dos Direitos  LGBT foi implantado por uma ONG fruto de um edital de um ano, do Governo Federal conforme correção de Vinícius Alves.

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