10 de novembro de 2024
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(Imagem: Kenji-Baptiste Oikawa/Wikimedia Commons)

Diego Calisto
Publicado pela Agência Jovem de Notícias, em 6 de agosto de 2015

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(Imagem: Kenji-Baptiste Oikawa/Wikimedia Commons)

No mês passado, o UNAIDS – Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS divulgou um relatório que apresenta dados atualizados em relação aos casos de HIV no Brasil e no mundo.

Acompanhei uma considerável cobertura da mídia dando visibilidade ao relatório e a temática do HIV/Aids, porém fiquei um pouco contrariado com chamadas do tipo “Aids retrocede no mundo e avança no Brasil”, visto que quando tratamos de algo tão delicado como o HIV precisamos olhar para muito além dos dados única e exclusivamente, uma vez que é preciso olhar o contexto de tudo isso e fazer uma análise madura e sensata da conjuntura da Aids, hoje, aqui no nosso país.

De acordo com o relatório do UNAIDS, o número de novas infecções por HIV diminuiu 35,5% entre 2000 e 2014. Se, em 2000, a estimativa de novas infecções no mundo foi de 3,1 milhões, em 2014, essa estimativa baixou para 2 milhões. Ponto para o mundo, ponto para os países que estão tratando a Aids com o devido respeito e prioridade.

Isso é um avanço imensurável e de grande impacto no cenário de enfrentamento da epidemia, contudo é importante destacar aqui que ela retrocede no mundo por conta, por exemplo, de países do continente africano, como Zâmbia e Zimbábue, que possuem epidemia generalizada. Ou seja, nem sequer faz sentido pensar em populações-chave ou populações vulneráveis, visto que grande parcela de pessoas estão infectadas e existe um expressivo número de tantas outras se infectando através de novos casos, e isso é tão homogêneo que fica difícil classificar as populações com maior e menor risco acrescido e por isso entende-se como epidemia generaliza. Nesses países os casos de HIV retrocederam consideravelmente, impactando o número e o percentual de infectados no mundo.

Acontece que existem países, como o Brasil, que a epidemia é concentrada, isto é, concentrada em populações-chave e populações vulneráveis, que são as que representam uma taxa de detecção muito acima da média nacional da população brasileira e, consequentemente, os casos de HIV se concentram majoritariamente nessas populações e isso se acentua ainda mais quando se percebe um recorte etário, em que os novos casos de infecções pelo HIV se concentram em jovens de 15 a 24 anos.

É importante destacar também que existem locais no Brasil, os chamados “hot-spots” como Rio Grande do Sul, que possuem um perfil de epidemia generalizada, dada a conjuntura e o cenário do HIV no estado, mas no geral a epidemia de Aids no Brasil é ainda concentrada em populações específicas, que possuem um risco acrescido de contrair o HIV.

O aumento de novos casos observado no Brasil também ocorre em outros países em que a resposta ao HIV começou precocemente. Alguns países pioneiros e vanguardistas na luta contra Aids, como o Brasil, também tiveram um aumento no número total de casos de HIV e isso não significa que a resposta à Aids retrocede nesses países. Pelo contrario. É justo nesse momento que precisamos fazer uma análise de conjuntura do contexto que temos hoje no Brasil, como ampliação da oferta de testagem, por meio de projetos como o “A hora é agora” e o “Viva Melhor Sabendo”, que são estratégias diretamente proporcionais ao número de novos casos, considerando que a cobertura de testagem aumenta e o número de casos de HIV também aumentará.

Contudo, é fundamental considerar que a juventude não viu e tampouco vivenciou e acompanhou as primeiras ondas de epidemia na década de 80 e 90 e pouco conhece sobre HIV e Aids e, a partir disso, temos um aumento no número de novos casos nas chamadas populações-chave no Brasil: os jovens gays, pessoas trans, usuários de drogas, profissionais do sexo e privados de liberdade — todas essas populações são prioritárias na resposta à epidemia de Aids, no Brasil e no mundo, principalmente os jovens pertencentes a essas populações.

O relatório chamado Como a Aids mudou o mundo apresenta também novas e ambiciosas metas que têm como objetivo acabar com a epidemia de HIV até 2030, tornando-a uma epidemia controlada. Com o objetivo de que até 2020, tenhamos 90% das pessoas infectadas pelo HIV diagnosticadas e que 90% delas entrem em tratamento com antirretrovirais e que  90% das pessoas em tratamento alcancem a carga viral indetectável (menos de 50 cópias por mililitro cúbico de sangue) o que reduz, segundo estudos como o HPTN052, a transmissibilidade do HIV em 96%.

Objetivo de Desenvolvimento do Milênio 6 – Combater o HIV/Aids

Além de citar o reconhecido protagonismo do Brasil no combate à Aids mundialmente, o relatório apresenta ainda o avanço global em relação a uma agenda construída entre países subdesenvolvidos e em desenvolvimento, estabelecida pela ONU em 2000, com 8 objetivos considerados prioritários para mudar o mundo, os chamados “Objetivos do Milênio — (ODM)” ou popularmente “8 jeitos de mudar o mundo”.

Acontece que, segundo o relatório, a meta do ODM 6 – Combater o HIV/Aids foi atingida, mas isso até a página 2, uma vez que ela falha em relação aos meios de implementação desse objetivo e dessa agenda e, diante disso, das 15 milhões (41%) de pessoas vivendo com HIV e que estão em tratamento, que foram alcançadas, poderíamos ter chegado a 20 milhões (50%) de pessoas vivendo com HIV em tratamento.

Acompanhei sempre que pude o monitoramento dos ODMs desde a RIO+20 e também acompanhei a construção da nova agenda que se formou no último dia 2, em Nova York, trazendo os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os chamados ODS, que se desdobram em 17 grandes problemas do mundo (objetivos) e 169 metas para erradicar a pobreza, promover universalmente a prosperidade econômica, o desenvolvimento social, os direitos humanos e a proteção ambiental.

Cabe enfatizar que a inclusão das PVHAs (Pessoas Vivendo com HIV/Aids) deu-se na reta final das negociações, como populações de vulnerabilidade dentro do contexto de desenvolvimento sustentável, graças a sensibilidade do negociador oficial do Brasil, o embaixador Guilherme Patriota e o forte tensionamento da sociedade civil, principalmente a brasileira.

Como jovem, gay e soropositivo —  com um perfil que dialoga direta e minimamente com os conceitos e questões relacionadas  as populações-chave —  procuro sempre ampliar meus horizontes, enxergando as novas perspectivas e estratégias que o Brasil tem agregado na luta contra a Aids. Por isso, é fundamental que tenhamos em mente que para qualquer relatório envolvendo dados sobre HIV/Aids, precisamos sempre considerar onde estávamos, onde estamos e onde queremos estar e tudo isso considerando que a sociedade civil organizada é a peça chave na luta contra a Aids e que esse protagonismo não deve se limitar a apenas a demandar, mas também propor idéias, iniciativas e estratégias em resposta à Aids.

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