29 de março de 2024

Nathalie Vassallo*

Publicado no portal Brasil Post, em 31/03/2014

“O Problema do gay” – começava minha mãe, “é a necessidade que ele tem de ser aplaudido”. Estávamos no nosso natal-de-nós-duas do ano passado e conversávamos sobre tolerância. Bom, essa é a minha versão – na de minha mãe, conversávamos sobre essa história de “gay querer demais”.

Este artigo é dedicado pra quem diz aceitar e respeitar homossexualidade e ainda se contorce ao enxergar um beijo gay; pra quem liga pra perguntar “mas é mesmo necessário fazer propaganda do relacionamento homossexual no Facebook?”; pro famoso e absurdo “não tenho problema com gay, mas precisa beijar na rua?!”; pros que insistem em se referir a namorados e namoradas de casais homossexuais como “amigo” ou “amiga”. E também pro pessoal gay que senta e assiste isso tudo sem dizer nada, permitindo e alimentando tal significante limitação social. Isso é o pouco do que tenho a dizer sobre essa coisa de “eu aceito, mas agora esconde”.

Tenho certeza que a maioria dos gays tem histórias pra contar quando o assunto é aceitação. Digo, como brincadeira, que não saí do armário – mas chutei a porta e saí dançando (ao som de Cássia Eller e Ana Carolina). Depois que o choque passou, a família foi, pouco a pouco, me presenteando com discursos de “eu aceito” – suas atitudes, porém, expressavam o oposto. A irmã de meu pai, por exemplo, me escreveu logo depois que tornei público meu relacionamento em mídia social. Com o título “ridículo”, a mensagem começava com “eu aceito e não tenho o menor preconceito” e terminava no “por favor, tire isso da internet”. A imagem de perfil da tia era ela e o marido, os dois sorridentes. A foto do casal continuava a aparecer na minha lista de mensagens: “você está me peitando”, ela brigava. E só piorou: me atribuiu tantos adjetivos – patética, destruidora de família, rebelde – só não chamou de bonita. O importante da história foi a ironia de cada uma de suas mensagens começar com uma versão ou outra de “eu lhe aceito, mas…”

Essa ignorância semântica é um absurdo que só dá problema. As pessoas falam, com frequência, “eu aceito” quando o que querem dizer é “eu (quase) tolero”. Ser tolerante significa aturar algo de que você não gosta muito da idéia, algo com que você não concorda ou que você associa com uns sentimentos negativos. O gay não quer demais – só pede pra ser aceito. Dizer “eu aceito e só quero que seja feliz” seguido de um “por que você precisa fazer propaganda da relação homossexual?” não é aceitação. Fugir para não falar sobre o namorado do seu filho pra vizinha não é aceitação. Apresentar a namorada da sua sobrinha como amiga não é aceitação. Aceitação é não ver nada de errado ali. Aceitar é ter como verdade, como normal, como apropriado; é compreender e até mesmo receber de braços abertos. Confundir essas duas palavras, além de ignorante, estraçalha com a paz da gente.

A verdade é que sempre há um processo – e não é fácil pra ninguém. Resolvi trazer a família inteira e parafrasear minha prima, quem uma vez escreveu: “o clichê [diz] que ‘a geração dos nossos pais não se preparou para isso’. Mas a verdade é que não nascemos preparados para nada”. É compreensível (e maravilhosamente consciente) dizer “eu tolero; ainda não aceito, mas me dê mais tempo – estou me esforçando”.

“Eu poderia te responder com o clichê de que “a geração dos nossos pais não se preparou para isso”. Mas a verdade é que não nascemos preparados para nada. Nobody does. Ao longo da vida aprendemos com as experiências acumuladas na “rua”, somadas à educação que recebemos em casa. Por educação quero dizer: noção de família, limites, respeito, espaço, e de como compartilhar e vivenciar o amor. Não estamos preparados, nos preparamos diariamente. “Como nossos pais”, cantaria Elis Regina.”
“…se há preconceito no mundo – e isso é uma neurose dos pais quando os filhos saem do armário – o pior preconceito está dentro de casa. Continuo batendo na tecla de que quem [coloca à margem] o filho(a) gay – são os próprios pais.”

– Thatiana Rei

Não é justo esperar imediata aceitação de ninguém. Pais criam expectativas, além de terem suas opiniões e conceitos formados – quebrar isso tudo numa frase só pode machucar. Não só há sempre um processo, mas um processo, talvez, bem difícil – e ter a ciência de onde estamos é fundamentalmente importante pra conseguir mover na direção certa e chegar a algum lugar.

Se você tem um filho – ou uma filha – e parou de perguntar sobre seus planos de casamento ou filhos uma vez que descobriu sobre sua homossexualidade; se ouvir perguntas como “e sua filha, querida, está namorando?” lhe causam extremo desconforto por não querer revelar que sua menina namora meninas; se você apresenta o namorado ou namorada gay como amigo, se é contra qualquer exposição gay em mídia social, se prega que orientação sexual é para ser guardada a sete chaves, esse texto é pra você: Não, você não aceita a homossexualidade ainda. Mas não tem problema; estamos todos juntos – no fundo mesmo, tudo que a gente quer é entender e se sentir compreendido, aceitar e ser aceito. Vamos ser bregas, falar baboseiras de amor, prometer respeito e dar as mãos ao decorrer do processo. Eu vou tentar o máximo compreender suas limitações; podemos começar com você perguntando se eu e minha namorada pretendemos ter filhos. Sim! – lhe respondo. E continuo: o que você acha do nome Graça pra nossa primeira menina?

*Nathalie Vassallo é pesquisadora, queer e publicitária.

2 thoughts on “O problema do gay

  1. Eu percebo é um certo receio “Social” em relação ao Homem Independente, que pode inclusive dar prazer a outro Homem, pelo “mero” prazer! Tenho vizinhos casal gay, em que um deles fica no apartamento e o outro, é autonomo, mas acaba saindo! Quando me mudei o que fica no apartamento buscou da sacada olhar para meu apartamento (pela janela); marido dele me trata mais “frio”! É aquela questão: quem segue roteiro heteronormativo, Não imagina que possa vir quem trate melhor, com deferencia, quem na relação siga o “check-list” de “dona de casa” (de antigamente)! Numa ocasião um “montador de moveis” veio fazer uma atividade para mim, simples para ele e nem sempre para todos os consumidores e, disse para mim que morando sozinho e sendo coroa, ele poderia me dizer que estava me desejando! Levei ao quarto e transamos! E comentou que concorrencia os homens alcançaram em relação a transa hetera: eu sexualizado no anus a ele, ambos excitados e ele podendo me penetrar sem KY, pela excitação do anus (glandulas sudoriparas ativadas)! Estavamos sem qualquer pressa!

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